AH! QUE SAUDADE ME DÁ!

A bênção Mamãe!
Deus te abençoe meu filho, tome cuidado, preste atenção, leve um agasalho, juízo, durma com Deus e etc.
Ah! Que saudade me dá!
Hoje finda o mês de maio de 2010, que é dedicado ás mães em todo o mundo.
Poderia entrar nos detalhes das pesquisas históricas, e informar que esse movimento começou na Inglaterra e foi instaurado no Brasil por Getulio Vargas, na década de trinta, no estado novo etc. e tal. No entanto, vou pedir licença ao querido leitor que se interessou por esta página, para dedicar esta homenagem a minha Mãe, Clotildes Volotão Bellieny, a “Dona Clotildes”.
Conheci outras Clotildes que eram apelidadas de “tides”, “tidinha”, “clô”, mas não trago lembranças de alguém ter dado outro tratamento a minha Mãe que não fosse “Dona Clotildes”. Assim era tratada por amigos, colegas e vizinhos. Tanto os seus irmãos mais velhos, quanto os mais novos, a chamavam de Clotildes. Dei-me conta que ainda não havia pensado nisso, a não ser agora que me propus a dedicar algumas letrinhas as Mães. Por que será que ninguém conseguia tratá-la no diminutivo? Que traço de caráter poderia ser tão marcante que pudesse impor esse respeito com a sua presença? Quem teve o prazer de conhecer “Dona Clotildes”, poderá descrevê-la como uma mulher de vanguarda que viveu a frente de sua época. Seu pai, Sr. Antonio Joaquim, era descendente de portugueses, enquanto sua mãe, Dona Isaura, era imigrante Italiana. Seu berço foi no interior do estado do Rio de Janeiro na cidade de São Fidelis, no ano de 1914, aos 22 dias de agosto. Nunca esqueci o dia do seu aniversário! Era sempre muito alegre e divertido! Nós a presenteávamos com as coisas mais bizarras que encontrávamos na fazenda. Frutas, criações, bolo de milho, tapiocas e bijus...
Ah! Que saudade me dá!
Era a terceira, de uma família de seis irmãos, dos quais, conheci quatro. Eu sou o seu quinto filho. Éramos seis, agora somos quatro. Mas isso fica pra outra hora. Quero voltar à figura marcante de “Dona Clotildes”. A qualquer momento que fosse encontrada, estava sempre com um sorriso nos lábios, uma palavra de compreensão, esclarecimento, conforto, afeto não faltava, isso tinha com abundancia. Ao mesmo tempo em que era a conselheira, também era a amiga e companheira. Distribuía, junto com o carinho e o afeto, tudo o que tinha, se outros estivessem necessitando. Desde remédios, ervas medicinais, roupas ou víveres. Meu pai por várias vezes iniciou um armazém para a venda de produtos de primeiras necessidades. Bastava chegar alguém dizendo que não podia pagar pelos produtos, que Ela, imediatamente, atendia as necessidades materiais e dizia: vá com Deus! O Senhor te acompanhe! A moeda que mais recebia era um “Deus lhe Pague Dona Clotildes!”. Já dá para deduzir que o comércio não foi adiante. Sua orientação religiosa foi em família Católica, herança da tradição européia. Quando eu nasci, Ela já era Batista por opção. Dizia que: “para servir ao Senhor, não era necessário rezar para os santos de barro”. Sempre teve o cuidado de passar para os filhos aquilo que para Ela era o melhor. Todos os dias, pela manhã e a noite antes de irmos para a cama, eram realizados o Culto Cristão no Lar. Longe de ser uma beata, Ela trazia consigo a certeza da importância do benefício que estava deixando como legado para todos nós.
Um fato inesquecível ocorreu certa tarde. Eu contava aproximadamente com 4 ou 5 anos de idade. Após ter aprontado uma das muitas peraltices de infância, Ela, chamando-me a realidade, trazia nas mãos um pequeno pedaço de madeira, um prego enferrujado e um martelo. Confesso que me causou um misto de espanto e curiosidade. O que será que estava para acontecer? Já estava acostumado as varinhas de "guachumba" ou ao democrático "chinelo". Com a tranquilidade e a segurança de quem sabe o que está fazendo e porquê faz, entregou-me os apetrechos e disse em voz pausada: -Você sabe o que fazer com isso. Vamos, faça. Confiante, comeceia a executar aquela "fácil" missão. Quando a metade do prego já havia penetrado a madeira, ouço aquela mesma voz, doce e aveludada: -Chega. Tirou do bolso do avental um pedaço de carvão, e usando-o como pincel, desenhou em torno do prego enferrujado um coração. -Agora, arranque o prego. Obedeci de pronto. -O que você vê? Fiquei gelado! Percebí que estava prestes a receber mais uma surra de Evangelho! Respondí: Um coração com um buraco no meio. - Agora tire daí o buraco. Pensei um pouco e disse já com as pernas tremendo e preferindo ter levado umas bõas chineladas: Não dá Mãe, o buraco do prego não vai sair. Com a mesma paciência, Ela explicou: "Meu filho, assim também é o coração de Mãe. Cada malcriação, cada desobediencia, cada coisa errada que um filho faz, é como um prego enferrujado que entra na madeira. Você pode arrancá-lo, mas as marcas permanecerão". Jamais esquecerei esta lição. Ah! que saudade me dá!
Vale ressaltar, que os merecidos corretivos, só eram aplicados por Ela de fato, após terem sido testados a intensidade da carga no próprio corpo. Parece que Ela sabia que restava pouco tempo para estar conosco.
Os Espíritos que vivem adiante de sua época, percebem quando seu tempo está se esgotando e não vai dar tempo para fazer tudo o que precisam ou o que gostariam de realizar. Era incansável. Mesmo nos momentos em que sua saúde estava fragilizada, conservava o sorriso nos lábios, confortando a todos os corações e almas aflitas que a buscavam. Quem ia visitá-la para levar afeto, recebia em troca, coragem e esperança.
Os filhos sempre tiveram tratamento especial. A cada um dedicava atenção diferenciada. Sabia como lidar com a alma humana com maestria sem nunca ter ido a uma faculdade de Psicologia. Estudou e fez Doutorado na Grande Escola do Aprendizado Universal, qualificando-se com nota máxima nas disciplinas da simplicidade, tolerância, paciência, compaixão, altruísmo, otimismo, compreensão, resignação, confiança, esperança, Fé e Amor.
Deixou-me um manuscrito intitulado “Carta ao Meu Filho Arleir” que se tornou o meu testamento e roteiro seguro para nortear a minha vida, o maior legado que um filho deveria desejar como herança. Quando sinto saudade ou necessidade de orientação, não deixo de consultar. Um documento permeado de orientações e citações do Evangelho, encorajando e estimulando a honestidade a Fé e a perseverança.
Ah! Que Saudade me dá!

- Dona Clotildes, minha Mãe: Admito não ter seguido todas as suas orientações. Também reconheço que meu entendimento sofreu modificações ao longo dos anos. Mesmo assim, espero que os equívocos que cometi no decorrer da minha Vida, sejam como antes, perdoados pelo seu coração, cuja essência palpita dentro do meu peito, desde os primeiros vagidos que ecoaram das suas entranhas, promovendo minha existência. Hoje, como teu Filho, Pai das netas, e Avô do bisneto que a Senhora não conheceu enquanto estava encarnada na Terra, posso entender porque o tratamento “Dona Clotildes” e peço a Sua Bênção!
A bênção MAMÃE! A bênção VOVÓ! A bênção BISA!
Ah! Que saudade me dá!

Nota: Dona Clotildes desencarnou em fevereiro de 1960 aos 45 anos de idade, (há 50 anos), após quatro anos de internação no Hospital Sanatório Santa Maria, em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro.
“Que Maria, a Rosa Mística de Nazaré, possa continuar presente em nossos lares e em nossos corações, abençoando-nos como MÃE”.
Arleir Bellieny.